Quando fui estudante do Ensino Médio a maior tecnologia que meu colégio possuía era um projetor de slides e um episcópio (equipamento que projetava em uma tela uma folha impressa). Retroprojetores e copiadoras Xerox ou Nashua eram comuns, ainda mais usando toner líquido (quem já usou uma sabe o tamanho porcaria que uma máquina dessas fazia).
Nessa época eu me gabava porque tinha um videogame/computador em casa (Gradiente Expert), onde eu precisava comprar jogos gravados em fita K7, ou digitar códigos monstros para que algo acontecesse na tela da minha TV de tubo. Isso tudo para não comprar os caríssimos cartuchos de jogos.
Pois bem, o tempo passou e nas últimas 2 décadas a tecnologia foi incorporada no nosso dia-a-dia. Essa tecnologia mudou nossa relação de trabalho, a forma com que construímos e solidificamos novas amizades, a maneira com que interagimos com as notícias e permitiu a multiplicação dos pontos de contato com os produtos que compramos ou admiramos. Se isso tudo é verdade (eu sinto que sim), imaginemos o que passa na cabeça de um adolescente em um colégio.
No ano passado estive em uma pequena cidade na região sul do Brasil e visitei um colégio particular, apenas para entender o como ele trabalhava no seu Ensino Médio. Me deparei com uma sala da 3a. série do Ensino Médio onde as carteiras eram aparafusadas no chão, todas viradas para frente e em filas indianas. No mesmo momento eu pensei: “isso é adestramento? Como os alunos conseguem se relacionar? Será que eles tem a liberdade de trabalhar em grupo?”
Ainda veio outra memória na minha cabeça, o seriado Cidade dos Homens, episódio Coroa do Imperador, cena do aluno Acerola viajando enquanto a professora tenta explicar a matéria usando um recurso tecnológico comum em escolas na década de 1990, o projetor de slides (até minuto 3:10):
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O mais interessante é perceber que corremos o risco de repetir o erro do video acima. Ao distribuir tablets para os alunos de escolas e faculdades, Instituições de Ensino renomadas podem cometer o erro de transferir para o equipamento a esperança do sucesso educacional do aluno. Não considero que o fato do aluno passar a ver o conteúdo em uma tela brilhosa e colorida mude sua relação com os tópicos abordados nas disciplinas.
O fato é que na maioria das vezes não há transposição de conteúdos, e sim a transferência da mídia onde eles se apresentam. Associe a isso o risco do professor não ser capacitado o suficiente, ou dos conteúdos não se adequarem a realidade dos alunos, e temos como resultado o uso do projetor de slides em salas onde os alunos não entenderam o porquê estão ali.
O MEC contribui com isso, ao modificar o ENEM para um uma espécie de vestibular nacional, onde os conteúdos cobrados ainda são apresentados como elementos principais, e não como suporte para a construção do conhecimento. Além disso, o MEC contribui ao não forçar que o currículo de formação de professores seja alterado (uma discussão que já tive aqui).
De um lado temos uma estrutura de avaliação que preza o conteúdo, do outro alunos desmotivados com a abordagem tradicional, sendo pressionados temos os colégios e faculdades que precisam de clientes, e por fim os pais dos alunos que sonham que seus filhos tenham um futuro de sucesso e compram a ideia de que a tecnologia é a salvação. E qual a saída para esse impasse?
Aposto na capacitação de professores, principalmente com uso de ferramentas e modelos prontos, ou quase prontos, para que eles possam ser os protagonistas do uso da tecnologia. Isso quer dizer, não basta entregar a tecnologia para alunos e professores, transferir conteúdos e indicar links externos para estudo. Precisamos cuidar para que nossos professores tenham ferramentas facilmente aplicáveis e disponíveis, ao alcance das mãos para auxiliar o dia-a-dia na sala de aula, ou fora dela.
Para finalizar, o sonho de todo o professor é ver o aluno mostrando que entendeu e tem como aplicar o conteúdo trabalhado, em um verdadeiro processo de educação por competências. O mesmo episódio Cora do Imperador, da série Cidade dos Homens, termina de maneira interessante. Vejam o vídeo abaixo, a partir do minuto 2:32, para entender como o Acelora entendeu a vinda da Coroa para o Brasil.
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Muito bom, Dênis! E esse episódio é fantástico. Usei muito nas aulas. Abração